A poucos meses da COP 30, a capital paraense sedia a Semana do Clima, um debate urgente sobre bioeconomia, transição energética e o futuro do planeta, com a floresta como protagonista.
Belém, ensaio para a COP 30: a Amazônia como palco do mundo

Há um mormaço diferente no ar de Belém. Não é apenas o calor que anuncia a chuva da tarde inesperada para um mês de julho, mas uma densa atmosfera de expectativa, um prelúdio do que está por vir quando a cidade se transformar, em breve, na capital do mundo. Na manhã desta terça-feira, 15, a Estação das Docas, em Belém, foi palco da cerimônia de abertura da I Semana do Clima da Amazônia. A capital paraense, sediando este evento inédito, se torna o grande palco de um momento histórico, onde a floresta, enfim, assume o papel de protagonista nas discussões globais sobre clima e preservação.
A escolha de Belém para a maior conferência climática do planeta nunca foi aleatória. Foi um recado claro: a solução para o estado de aquecimento constante do mundo passa, obrigatoriamente, por esta floresta e pelos povos que a guardam. A cerimônia contou com a presença do Governador do Estado, Helder Barbalho, que destacou a relevância do evento para o posicionamento do Pará e da Amazônia no cenário internacional. Nas palavras do anfitrião, a intenção é consolidar a região como protagonista e deixar legados permanentes para a população amazônida. O desafio, segundo ele, é fazer com que a floresta viva possa valer mais do que a floresta morta, transformando a riqueza natural em desenvolvimento social e econômico.
Nos corredores da Estação das Docas, o debate ecoa a ansiedade do mundo: o assunto é urgente. As palavras de ordem são velhas conhecidas que buscam novos significados: desenvolvimento sustentável, bioeconomia, transição energética e justiça climática. O combustível dessa discussão é a busca por um modelo que finalmente entenda que a maior riqueza da Amazônia brota do chão e voa com as asas de um jacamim. O evento, uma iniciativa que reúne lideranças dos setores público, privado e da sociedade civil, busca construir, de forma colaborativa, uma visão de longo prazo para a região.
Um coro de vozes se forma para discutir os caminhos. Ana Toni, diretora-executiva da COP 30, garante que “Muito do que será debatido nesta semana especial é um pouco do que queremos trazer também para a COP30” e que a conferência precisa ser a COP das pessoas e da ciência, traduzindo decisões globais para o cotidiano da população. Segundo ela, se antes as decisões vinham “de cima para baixo”, hoje a mudança parte da base da sociedade.
Do setor privado, representado por empresas como Hydro e Fundo Vale, vem a promessa de aliança, com foco em soluções para uma economia de baixo carbono. Da sociedade civil, a voz de Marcello Brito, secretário executivo do Consórcio Amazônia Legal, soa como um alerta necessário. Ele lembra que a construção de caminhos eficazes para a Amazônia deve ser feita “de dentro para fora”, valorizando as soluções locais para problemas que são, ao mesmo tempo, regionais, nacionais e globais.
O evento também foi marcado pelo reconhecimento do potencial turístico e econômico da região. Segundo Anderson Baranov, CEO da Nosky Hydro e presidente do Simineral, “é importante que as pessoas venham para discutir, abrir a mente. Muitos, nunca vieram aqui, então, é uma oportunidade única de mostrar a beleza da Amazônia, sua floresta, sua cultura, sua culinária. Mas, também mostrar os desafios que temos e buscar ações concretas. Vamos fazer dessa Semana do Clima um evento anual e cada vez mais potente nos aprendizados que teremos uns com os outros”, concluiu Baranov.
André Guimarães, Diretor Executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e Enviado Especial da Sociedade Civil para a COP30, destacou a importância de dialogar sobre os desafios e soluções para a preservação da Amazônia. “Estamos falando de uma região que, sem ela, não conseguimos estabilizar o clima do planeta. Precisamos usar a empatia brasileira para chamar todos à conversa e buscar soluções concretas”, afirmou.
Patrícia Daros, diretora do Fundo Vale, reforçou o compromisso da iniciativa privada na conservação da floresta. “A Vale está na Amazônia há 40 anos e, por meio do Fundo Vale, busca transformar essa história em ações concretas. Parcerias entre setor privado, governo e sociedade civil são essenciais para avançarmos na preservação e no desenvolvimento sustentável”, disse.
Um destaque da programação foi o painel “Responsabilidades e Compromissos das Empresas no Enfrentamento da Emergência Climática”, que reuniu representantes do setor empresarial para discutir o papel das corporações na preservação da floresta e na transição para uma economia mais sustentável. Os participantes reforçaram a importância de ações concretas, transparência e parcerias estratégicas para alcançar metas de redução de emissões e promover a conservação da biodiversidade amazônica.
A discussão ganhou contornos de terra batida quando a palavra foi passada a Marcello Brito, a voz do Consórcio Interestadual da Amazônia Legal. Ele agiu como um tradutor, puxando o debate do ar-condicionado dos salões para a realidade dos territórios. Para Brito, a COP30 não pode ser apenas um palco para mais promessas; ela é uma “oportunidade histórica” de costurar o abismo que existe entre o que se fala e o que se faz.
Sua fala foi um lembrete contundente de que compromissos internacionais são letras mortas se não se transformam em “planos robustos, construídos com participação social e territorial”. É o recado de que a caneta que assina um acordo em um evento global precisa sentir o peso da responsabilidade de quem vive na Amazônia.
A Semana do Clima é, portanto, mais do que uma vitrine. É um espelho. Nele, a Amazônia se vê e se mostra ao mundo, não como um cenário exótico, mas como um ator central, com propostas, dores e a teimosia de quem sabe que a floresta não é o problema, mas a única solução possível. Belém ensaia seu papel mais importante, na esperança de que o mundo não venha apenas para o espetáculo, mas para atuar junto.
A floresta não fala por discursos, mas pelo ar que respiramos. E o mundo, enfim, parece prender a respiração para escutar.