Reajustes altos, cancelamentos e expulsões: planos de saúde estão no topo das reclamações, diz coordenadora do Idec

Marina Paullelli afirma que operadoras descumprem leis ao interromper tratamentos e empurrar contratos menos vantajosos

Reajustes acima de 20%, exclusões de médicos e laboratórios sem aviso prévio, dificuldade de contratar planos com maior proteção jurídica e cancelamentos de contratos no meio de tratamentos de câncer ou autismo. Esses são apenas alguns dos problemas enfrentados por consumidores no setor de saúde suplementar, que “segue dominado por poucas empresas com muito poder e muito dinheiro”, como explica a coordenadora do Programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marina Paullelli.

Ao BdF Entrevista, da Rádio Brasil de Fato, Paullelli lembra que o Código de Defesa do Consumidor reconhece o paciente como parte vulnerável da relação contratual, especialmente quando se trata de um serviço essencial como o acesso à saúde. Mesmo assim, os planos de saúde lideram o ranking de reclamações recebidas pelo Idec, principalmente por reajustes abusivos, negativas de cobertura e cancelamentos unilaterais.

“Historicamente, o plano de saúde fica no topo das reclamações”, afirma a coordenadora. “No ano passado, no ranking que foi divulgado esse ano, planos de saúde permaneceram no topo das reclamações e as principais dúvidas se referiram justamente a reajustes abusivos. Depois, vêm dúvidas sobre contratos e, por fim, dúvidas relacionadas a negativas de cobertura e dificuldades de atendimento”, indica.

Em 2024, as reclamações contra as empresas de planos de saúde tiveram a maior porcentagem entre os associados do Idec, com 29,10% do total. Conforme o instituto, as principais queixas apontadas são dúvidas e reclamações sobre reajuste abusivo (25,85% dos casos). Seguem-se  problemas com contrato (19,49%), sendo que desses, quase metade são problemas com reembolso e, depois, relacionados a descredenciamento. Prática abusiva (cancelamento unilateral de contrato e exclusão de dependentes) e negativa de cobertura ficam empatados em terceiro lugar, com 13,14% das queixas cada.

“O contrato de plano de saúde é feito para o consumidor conseguir usar em um momento delicado de saúde, quando ele precisa, e o que verificamos nas denúncias é que esses rompimentos acontecem justamente quando o consumidor está em um tratamento caro”, aponta Paullelli. Segundo dados da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), foram registradas mais de 5,4 mil reclamações de cancelamentos unilaterais de planos de saúde no portal consumidor.gov.br entre abril de 2023 e janeiro de 2024.

O lobby dos planos coletivos

Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), os planos individuais e familiares representam apenas 16% do total contratado no Brasil. Com regras mais protetivas, como teto de reajuste anual e proibição de cancelamento por parte das empresas, são de difícil acesso. “Não é interessante para as operadoras comercializarem essa modalidade de produto, justamente porque elas protegem mais o consumidor nesses aspectos tão importantes”, afirma Marina.

Já os planos coletivos e por adesão, amplamente ofertados pelas operadoras, não têm limite de reajuste e podem ser cancelados com mais facilidade. Em julho, a ANS determinou que o reajuste dos planos individuais e familiares pode ser de, no máximo, 6,06% no período entre maio de 2025 e abril de 2026. Já os planos de saúde coletivos ou empresariais não têm limite de reajuste, já que a agência entende que existe maior possibilidade de negociação entre operadora e contratante.

Para Marina, a resistência à regulação mais rígida do setor se deve, em grande parte, à atuação do lobby empresarial. “Esses argumentos de cunho econômico, de risco ao mercado, não se concretizaram. Os dados da própria ANS mostram justamente o contrário. Tem mais consumidores que contratam planos de saúde, o mercado está estável financeiramente”, contesta.

Ela destaca ainda que cláusulas genéricas de reajuste, mudanças unilaterais na rede credenciada e a omissão de critérios de cálculo são exemplos de abusos frequentes nos contratos, especialmente nos coletivos. “Essas mudanças contratuais, sem aviso, que prejudicam os tratamentos em curso, são práticas abusivas e devem ser denunciadas à agência reguladora”, orienta.

Veja algumas orientações de Marina Paullelli:

  • Para conferir se o reajuste de até 6,06% foi aplicado corretamente no seu plano individual, verifique o boleto de cobrança. O percentual deve estar indicado.
  • Cancelamentos no meio do tratamento são ilegais, inclusive nos planos coletivos. A recomendação é exigir resposta por escrito da operadora, denunciar aos órgãos de defesa do consumidor e, se necessário, acionar a Justiça.
  • O Idec mantém um canal de orientação e denúncias no site www.idec.org.br.

Para ouvir e assistir

BdF Entrevista vai ao ar de segunda a sexta-feira, sempre às 21h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo. No YouTube do Brasil de Fato o programa é veiculado às 19h.

Fonte: Brasil De Fato / Editado por: Thalita Pires

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